O amor inventa o corpo que não é um objecto,
o caralho que não é uma coisa, o peito
íntimo como um amante.
o nobre animalzinho dos órgãos
que antes queríamos morrer a devorá-lo.
Eu estou a isolar a palavra amor do objecto,
arredada do corpo astral como comida
reluzente na travessa.
Estou a isolar a palavra amor do rapaz
com uma pele em que a luz mergulha
e o cabelo vermelho como bife na brasa.
Quando se debruça da sua janela como gelado derretendo-se
a minha boca saliva sal ardente.
Eu estou a isolar a palavra amor desse
desejo de morder.
Estudamos todos o objecto, aguardando o momento
em que a pessoa se torna uma coisa.
Na câmara escura vemos a mulher
voltar-se por um instante para um objecto com uma quantidade
específica de
sangue a brotar da boca.
O amor não representa esses objectos – é capaz de seguir uma mulher
por toda a vida até a morte e continuar ainda
a declará-la ela própria.
Eu estou a isolar a palavra amor dos vorazes comensais
e a colocá-la aqui na boca da mulher morta
como a cabeça de um galo de combate, para ser novamente sugada
para a vida.
*
Livro: Satanás Diz de Sharon Olds
Tradução de Margarida Vale de Gato, Antígona